Nossas Histórias | Seu Próximo Jogo #15
nesta edição: jogos com histórias pessoais, significados íntimos e objetos que contam o nosso passado
Bom dia pra você do outro lado da tela! Essa é a décima quinta edição da sua curadoria semanal de jogos de jogos únicos, marcantes e com personalidade ― quem sabe você não encontra aqui Seu Próximo Jogo? Meu nome é Gabriel Toschi e temos outro texto convidado dessa vez! Um dos textos foi escrito pela minha grandíssima amiga Mirella; na verdade, ela me mandou ele pra edição especial de fim de ano, mas eu tive que resumir o texto na hora. Só que eu gostei tanto que ele merece um espaço pra vocês aproveitarem-no na íntegra.
Além disso, eu tenho um comunicado importante pra fazer sobre a newsletter: a partir dessa edição, a SPJ vai se tornar quinzenal ao invés de semanal, com novas edições a cada 15 dias na sexta às 9h. Por mais que eu esteja amando ter esse local pra falar dos jogos que gosto, eu quero também focar em outros projetos que são tão importantes pra mim quanto, assim como algumas responsabilidades pessoais também. Assim, essa é a forma mais saudável pra eu manter um espaço que gosto tanto (e espero que vocês também!). Obrigado pela paciência e vamos para os jogos de hoje 💜
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na edição de hoje: objetos contam as histórias da nossa vida e pelo que passamos. esses jogos sabem exatamente disso para contar tramas lindas que tocam o coração
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Unpacking
um jogo sobre mudanças
por Mirella Braga
Unpacking é um jogo sobre mudanças. Neste puzzle relaxante, você começa num quarto infantil já mobiliado, cheio de caixas fechadas, e o seu objetivo é desempacotar tudo (como diz o nome do jogo) e arrumar o quarto colocando os itens onde quiser. O desafio não é muito grande e reside em organizar os pertences para caberem nos espaços e guardar objetos em lugares corretos, por exemplo, o jogo vai acusar erro se você guardar o shampoo no quarto em vez do banheiro.
E é nessa estrutura simples que Unpacking se mantém até o fim. Do quarto infantil, você passa para um quarto de adolescente. Do quarto adolescente, para um de jovem, dividindo um apartamento com outras pessoas. Depois morando sozinha, e assim por diante. São nessas mudanças que a narrativa do jogo se constrói. Você descobre quem é a personagem pelos objetos que ela possui, pelas coisas que mantém, pelas coisas que deixa para trás e pelos novos itens adquiridos.
Você vê a história de uma vida ser contada pelo o que cabe em caixas de papelão. E é muito impressionante como isso é feito de maneira simples e elegante, sem diálogos, sem nem ver o rosto da protagonista, só com os objetos e com a maneira que você ocupa os espaços. E é aí que o jogo brilha, porque eu acho que precisa ser muito bom, pra conseguir dizer bastante com tão pouco.
Foi uma experiência que me marcou demais e me emocionou porque, além da história contada ali, me fez refletir sobre diversos aspectos da minha vida e da vida em geral. Me fez pensar sobre o que levamos conosco, no que penduramos na parede e usamos para enfeitar estantes, no que guardamos da infância, nossos hobbies que podem virar profissões, ser nosso bote salva vidas ou só uma distração, interesses que surgem, somem e que perduram, no que escolhemos expor e no que escolhemos esconder num armário.
Que objetos às vezes são só objetos, mas também podem refletir nossa personalidade, transmitir quem somos, e serem cheios de significados e lembranças. E também me fez pensar no jeito que ocupamos e dividimos espaços, nos lugares que são designados a nós e naqueles que escolhemos. Em como às vezes acabamos nos encolhendo pra caber onde não deveríamos estar e como isso pode dizer muito sobre relações e afetos, que abrir um espaço na vida pra outra pessoa entrar pode ter muitos sentidos.
Tudo isso representa coisas demais, representa a vida: crescer, prosperar, falhar, recomeçar, evoluir. Manter. Mudar. Unpacking é um jogo sobre mudanças. Ou também é só um puzzle aconchegante, bonitinho e curtinho, com uma arte adorável e que gera um GIF no final de todas as fases que é a coisa mais satisfatória do mundo de olhar. Fica a seu critério.
Unpacking
por Witch Beam, Humble GamesSteam (Windows/Mac/Linux)
PlayStation Store
Xbox Store / Game Pass
Nintendo Switch
Assemble with Care
a magia de consertar fica marcada pra sempre
por Gabriel Toschi (site / twitter)
Alguns jogos ressoam com nossas histórias pessoais de uma forma que outras pessoas talvez não entendam direito. Ele para de ser apenas “um bom jogo” pra ser “uma experiência que lembrou da minha vida”. Assemble with Care foi um desses exemplos pra mim. Criado pelo time por trás do ótimo Monument Valley, o jogo conta a história de Maria, uma “consertadora viajante” que acaba de chegar à cidade de Bellariva, dias antes de um famoso festival gastronômico local.
Intercalando momentos de visual novel e puzzles, seguimos a história de Maria na cidade, conhecendo novas pessoas e entendendo suas histórias e conflitos pessoais — até começar a entender também os seus próprios conflitos. Para cada história que alguém conta, há um objeto importante pra ela que está quebrado e precisa ser consertado. É nesse momento que os puzzles entram em jogo, com a sua missão de desmontar o objeto, entender o seu funcionamento, substituir as peças quebradas e deixá-lo novinho em folha. Esses desafios são bem simples até, mas trazem mecânicas diferentes e interessantes a cada novo objeto.
O jogo é basicamente isso, uma pequena história que mostra como não só os objetos da nossa vida precisam de conserto, mas as nossas relações com quem amamos (e até com nós mesmos). É uma história muito bonita, sabe, mas aí foi quando bateu diferente pra mim. Meu pai é uma das pessoas que mais amo e admiro no mundo todo e ele consegue consertar qualquer coisa. Gambiarra é praticamente o nome da família às vezes. Desde criança, eu vejo ele na oficina consertando coisas, repondo peças e trazendo de volta objetos importantes pra mim e pras pessoas a minha volta.
Sempre pareceu tão mágico o que meu pai conseguia fazer, sabe? Eu não entendia metade das coisas que ele fazia, mas ele soldava umas coisinhas coloridas num lugar e meu brinquedo voltava a funcionar! Mesmo hoje, formado em Ciência da Computação, eu não entendo metade da genialidade do meu velho. Jogar Assemble with Care, entretanto, me deu um gostinho de como é ser meu pai. Eu posso não saber de eletrônica ou carpintaria, mas eu sei resolver puzzles: consertar aqueles objetos, tão importantes pras pessoas, me fez entender porque era tão mágico o que meu pai fazia.
É um ótimo jogo e eu recomendo, mas ele sempre vai me lembrar o quanto eu admiro o meu grande pai. (te amo, pai!)
Assemble with Care
por ustwo games